Aliás, todos estes atletas supostamente tomaram (ou ainda tomam) analgésicos para aliviar as dores. Mas não estão sozinhos.
80% da população mundial sofreu ou sofre de algum tipo de dor na coluna vertebral — e parte significativa dela se automedica.
50 milhões de pessoas sofrem de dores crônicas no Brasil. Desses 50 milhões de sofredores, 60% desenvolvem depressão, de acordo com um artigo da revista ÉPOCA (14/03/2005) — 2 décadas atrás, ressalte-se. Boa parte delas envereda pelo caminho da automedicação e do uso excessivo de analgésicos e anti-inflamatórios. Há “mais gente tomando anti-inflamatórios, porque é mais simples do que enfrentar uma terapia, mudar a dieta ou fazer relaxamento”, dizia o saudoso Daniel Salomon, especialista em artrite do Brigham and Women’s Hospital — um dos mais conceituados centros de estudo da dor nos Estados Unidos.
Dados da Organização Mundial de Saúde informa que:
A situação tem sido e é preocupante — especialmente considerando esta lista publicada na ÉPOCA anos atrás (26/05/2008). Das dez medicações mais vendidas no Brasil nos últimos dez anos (desde 1998, portanto), analgésicos e anti-inflamatórios ocupam pelo menos 05 posições (a 3ª, a 5ª, a 6ª, a 7ª e a 8ª, para ser mais exato) — mais do que muitos remédios infinitamente mais imprescindíveis. Será que isto mudou ao longo dos anos? Este ranking pode também ser reflexo do já mencionado aumento de automedicação e uso excessivo destes tipos de medicamentos?
O que o público ignora é que analgésicos e anti-inflamatórios não são exatamente inofensivos. Há efeitos colaterais. Alguns sérios. Como todos os medicamentos, são feitos para serem consumidos por tempo determinado e com doses preestabelecidas.
Sim, se automedicar definitivamente não é uma prática salutar. Ingerir medicamentos sem prescrição médica pode ser perigoso. E misturar medicações mais ainda. A interação medicamentosa (combinação de diferentes medicamentos), quase nunca avaliada, pode causar inúmeros prejuízos à saúde do paciente. Dr. Antônio Carlos Lopes, presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica (SBCM), alerta que “um remédio não-tóxico pode assumir posição contrária quando misturados a outros” (DIÁRIO DE ILHÉUS, 25/08/2007).
Pior ainda, um artigo antigo da VEJA relatou na época em que foi publicado que uma estimativa de “250.000 brasileiros estejam sob o risco de sofrer uma reação alérgica intensa, e a maioria desses episódios é deflagrada por remédios de uso corriqueiros, sobretudo analgésicos e anti-inflamatórios, revela uma pesquisa da associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia. O dado chama a atenção num país como o Brasil, onde a automedicação é um hábito cultivado por 60% da população. 50% das crises graves de alergia são causadas por medicamentos, sobretudo analgésicos e anti-inflamatórios”. A Sociedade Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai) “estima que 14 e 16 milhões de brasileiros têm alergia a algum tipo de medicamento. O número representa entre 6% a 7% da população, que é alérgica principalmente a antibióticos e anti-inflamatórios”. Isso mesmo: o consumo excessivo destes medicamentos, além de ser alarmante, é também uma armadilha.
Especialistas chegam ao ponto de desaconselhar o uso de analgésicos mais de duas vezes por mês. O saudoso neurocirurgião Edgard Rafaelli Jr. afirmava que “quanto mais analgésicos se toma, mais a dor pode se perpetuar. O cérebro produz endorfinas para combater a dor, mas, quando se exagera na quantidade de remédios, ele deixa de fabricá-las adeqüadamente e a pessoa pode criar uma cefaléia crônica diária”. O corpo deixa de ser um veículo adequado para sensações prazeirosas. Com passar dos anos, a atenção do organismo fica toda focada no combate ao estímulo doloroso e as sensações agradáveis são “apagadas” do radar (ÉPOCA, 14/03/2005).
“A automedicação é extremamente arriscada e acarreta elevados custos pessoais e coletivos. Ao ingerir um fármaco inadequado, o tratamento correto de uma enfermidade pode ser retardado. O fato interfere na terapêutica apropriada e faz com que a pessoa permaneça mais tempo em tratamento ou piore, o que envolve mais investimentos em medicação, consultas, exames, etc.”, adverte o dr. Jorge Machado Curi, ex-presidente da Associação Paulista de Medicina (DIÁRIO DE ILHÉUS).
Felizmente estão surgindo estudos que alertam para os efeitos potencialmente nocivos do uso indiscriminado e crônico de determinados analgésicos e anti-inflamatórios, usados como principal forma de tratamento da coluna. E as autoridades estão tomando providência:
Correto seria usar tais remédios “por um breve período de tempo, o suficiente para amenizar os momentos de crise”, afirma Troels Jensen, professor de neurologia no Departamento de Medicina Clínica da Aarhus University, fundador do Centro Dinarmaquês de Pesquisas da Dor (The Danish Pain Research Centre) e então presidente da International Association for the Study of Pain / Associação Internacional para o Estudo da Dor (ÉPOCA, 14/03/2005). Mesmo assim, somente “em casos muitos específicos”, diz o reumatologista Daniel Feldman (VEJA, 18/04/2007). Analgésicos e anti-inflamatórios não devem ser tomados como água com açúcar. O efeito, além de ser paliativo, em hipótese nenhuma substitui a boa e velha reabilitação (e, por que não dizer, a Quiropraxia).
Remédios, quaisquer que sejam eles, devem ser consumidos com parcimônia. “Quando consumidos de forma adequada, num período controlado e com indicação médica, dificilmente provocam problemas”, diz o cardiologista Antonio Carlos Chagas, Professor Titular na Faculdade de Medicina do ABC e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia (ver mais sobre este assunto nos artigos 63, 103, 161, 211 e 249 e 256 e 260).
É óbvio que ninguém deseja sentir dor. Mas, no que diz respeito à coluna vertebral e demais problemas de cunho neuromusculoesquelético, o melhor é procurar tratar a causa.