Bryant Stamford, professor e coordenador do departamento de ciências de exercícios da Universidade de Hanover (uma tradicional, pequena e cara instituição de ensino localizada no estado de Indiana, fundada em 1827), escreveu por 42 anos uma coluna semanal publicada por algumas dezenas de jornais nos Estados Unidos: The Body Shop (Oficina do Corpo) — extinta em 2018. Nela, abordava um sem-número de assuntos e tópicos envolvendo atividades físicas.

Stamford prestava também consultorias a empresas sobre questões ergonômicas. E, certa ocasião, foi chamado para resolver um problema recorrente numa fábrica: vários funcionários estavam sofrendo de dores lombares. Um dos gerentes, desesperado com a quantidade de casos, pediu para ele analisar a situação e descobrir o motivo.

Após fazer testes de esforço e medição de peso que os trabalhadores tinham que carregar, Stamford concluiu que não havia nada de anormal. Quase nada ultrapassava a marca de 25 quilos. Os funcionários, na sua maioria, eram homenzarrões fortes. Então, porque havia esta alta incidência de lombalgias?

A resposta estava exatamente aí. Homens grandes e fortes, mas sem flexibilidade e com barrigas proeminentes — uma isca perfeita para a Síndrome do Clipe de Papel (aparentemente esta terminologia foi batizada pelo próprio Stamford. Não aparece numa busca rápida no Google. O nome não deve ter colado e ficou relegado ao artigo em questão do The Body Shop).

Curiosamente, o que aparece é Broken Paperclip Syndrome (uso excessivo que causa danos ao tecido conjuntivo); Paperclip-maximiser syndrome (“um jogo viral (…) usado como meme para consequências negativas de uma Inteligência Artificial poderosa demais”); Paperclip Syndrome (quando um zé-mané gosta de uma menina e gruda nela tal qual um clipe de papel gruda num imã).

Bem, seja lá como for, a tal Síndrome do Clipe de Papel funciona desta maneira: um barrigão altera o centro de gravidade do indivíduo, puxando-o mais para frente. A musculatura lombar (paravertebral) tem que trabalhar mais para manter o corpo ereto. Para ter uma noção do perigo, um simples aumento de um quilograma na gordura abdominal é suficiente para multiplicar a carga exercida pelos músculos lombares. O efeito é exponencial.

Isto acarretará em fadiga da musculatura paravertebral, que terá dificuldade para segurar o “alinhamento” da coluna. E pra completar o quadro, ao dobrar a cintura para pegar peso com as mãos, a alavanca gerada por este movimento causa um aumento também exponencial na musculatura lombar, que é muito maior do que o objeto em questão. É física, pura e simples: numa gangorra, o peso é multiplicado pela distância.

Como se isto não bastasse, a maioria das pessoas sofre de crônico encurtamento da musculatura isquiotibial, fruto da sociedade e do tempo em que vivemos. Sentamos por muito tempo, andamos muito de carro e somos bastante sedentários. E por conta disso, quase todo mundo tem a musculatura posterior da coxa encurtada.

Trata-se dos isquiotibiais — um grupo de três músculos que se localizam na região posterior da coxa: o semitendinoso, o semimembranoso e o bíceps femoral. Todos (e a cabeça longa do bíceps) se originam na tuberosidade isquiática (aquele ossinho da bunda). Os dois primeiros se inserem na tíbia (canela). O bíceps femoral vai para a cabeça da fíbula.

Estes músculos, quando encurtados, forçam a pelve para trás e modificam o “alinhamento” vertebral numa posição que não é natural.

Vamos resumir então a situação: a tal barriguinha de cerveja faz com que a musculatura lombar trabalhe mais. A fadiga resultante provocará (juntamente com o encurtamento dos isquiotibiais) em desalinhamento (ou melhor ainda, disfunção) vertebral. O efeito gangorra, ao pegar qualquer peso, até um simples clipe de papel (daí o nome cunhado pelo autor), forçará uma estrutura já fragilizada. (Fonte: jornal The Quad-City Times, 23/04/2010)

Sem “alinhamento” vertebral adequado e boa tonicidade muscular, os discos ficam expostos a esforços aparentemente insignificantes, como, por exemplo, abaixar-se para pegar qualquer objeto, por menor que seja. Muitas vezes é essa a gota d´água que faltava, por exemplo, para um já comprometido disco herniar. E a consequência é dor.

Imaginem isto num ambiente industrial, em que trabalhadores têm que suspender e carregar peso em posições nem sempre corretas. O trabalhador, a empresa e o governo terão prejuízos. O inevitável afastamento do trabalho estigmatizará o funcionário, diminuirá a produção da empresa e onerará a previdência. Ninguém sai ganhando.

Stamford sugere tonificar a musculatura abdominal (de acordo com ele, reduzindo assim a barriga), e alongar os isquiotibiais. Algumas companhias aéreas já adotam o uso de cintas lombares reforçadas, exclusivamente para pegar peso e nada mais. Poderiam também ser parte da solução — fosse ela tão simples assim (talvez seja por isso que o termo não colou).