Dor não é brincadeira.
Mas precisamos dela. É o nosso sistema de alarme — sobretudo a dor aguda. Esta foi feita para ir embora “assim que a origem do problema desaparece”. Já com as dores crônicas, o negócio é outro. Esta aí não necessariamente obedece aos preceitos fisiológicos da dor como defesa. “Neste caso, as células nervosas permanecem superativadas mesmo sem a presença dos estímulos dolorosos originais”. Ou seja, os neurônios, por um mecanismo perverso de memória, continuam a transmitir dor mesmo sem existir mais a razão desta. (Revista VEJA, 24/08/2011). Com a fibromialgia, por exemplo, a pessoa sente dor o tempo todo. Atinge de 3 a 5% da população e é sete vezes mais prevalente em mulheres do que nos homens (ver Artigo 32).
Tratar dores crônicas se tornou um desafio para médicos, fisioterapeutas, massoterapeutas, acupunturistas e Quiropraxistas. Somente nos opioides, a indústria farmacêutica movimenta trilhões de dólares por ano. Observem estas estatísticas:
Tá certo, tá certo, nem todo analgésico é opioide. Ainda assim, como explanado num artigo anterior, medicação não é suco. Sempre há alguma maneira alternativa para combater dores crônicas. Nossa profissão é apenas uma delas.
Mas já imaginaram um médico efetivamente prescrever orgasmos como analgésico? A noção parece absurda, mas visto os fatos listados acima, seria definitivamente mais saudável do que tomar opioides, não seria?
O fato é que o ser humano reza por várias cartilhas. E para que possamos entender melhor este quebra-cabeça que é a dor, vale a pena jogar o pudor e os preconceitos por terra e conhecer este interessante estudo que merece ser explorado com mais profundidade.
O psicólogo e neurocientista americano Barry R. Komisaruk “passou 30 de seus 72 anos investigando os benefícios do prazer sexual no bem-estar das mulheres”. Nesta área, o professor da Universidade Rutgers, de Nova Jersey, é praticamente um pioneiro. Publicou inúmeros artigos e co-escreveu um livro, The Science of Orgasm (A Ciência do Orgasmo, JHU Press, 2008; 376 pgs.) — uma cuidadosa (e extensiva) análise dos aspectos neurológicos, farmacológicos e hormonais do orgasmo relacionados à saúde.
Seus estudos até então focavam no “resultado do orgasmo no coração da mulher e também os benefícios do orgasmo masculino para evitar o câncer de próstata”. Já este “seu último estudo demonstra que o clímax estimula todas as principais áreas do cérebro e tenta encontrar possíveis usos terapêuticos do estímulo vaginal” — especificamente “no tratamento de pacientes com ansiedade, depressão ou dependências”.
Para coletar dados, Komisaruk monitorou atividades cerebrais de mulheres se masturbando até o orgasmo — dentro de um aparelho de ressonância magnética!
Chegou a algumas interessantes conclusões:
De acordo com o pesquisador, há mais semelhanças que diferenças no orgasmo da mulher e do homem. Mas o que direcionou seus estudos para o orgasmo feminino foi que encontrou “evidências de que o estímulo vaginal tem a capacidade de bloquear a dor sem necessidade sequer de alcançar o orgasmo. Demonstramos que ambos os prazeres atuam como calmante, mas que o orgasmo é mais efetivo que a simples estimulação. A partir disso, muitas mulheres me disseram que utilizam a estimulação vaginal para reduzir o mal-estar da menstruação ou a dor provocada pela prática de esportes. E isso funciona para elas. Meus estudos somente conseguiram estabelecer que o orgasmo reduz a dor menstrual imediatamente e pode ter um efeito por horas. O alívio das dores nas costas (olhaí!) é outro efeito benéfico da estimulação vaginal e dos orgasmos”.
Claro, o tema é delicado. Praticamente não há estudos sobre o assunto. O que já ficou comprovado é que “as mulheres que tinham mais orgasmos gozavam de uma melhor saúde cardíaca. O estudo em homens mostrou que os que tinham menos orgasmos não haviam liberado substâncias tóxicas que estavam acumuladas na próstata pela ausência de ejaculação. Esse fator os faz mais propensos ao câncer”.
De qualquer maneira, ao ser indagado se o resultado do estudo “seria suficiente para oficializar uma prescrição médica de orgasmos”, o doutor Komisaruk foi taxativo: “Eu já recomendo”. Mas reiterou que, “para conseguir que isso seja feito de maneira regular são necessárias mais pesquisas. Dependerá das descobertas que façamos no futuro”.
Até porque a questão é complicada, visto que “no Brasil, 30% das mulheres já confessaram que não têm orgasmo”, de acordo com a Dra. Carmita Abdo, médica e professora de psiquiatria e coordenadora geral do ProSex, Projeto de Sexualidade do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo.
Sim, o assunto é complexo. E o proverbial buraco, mais embaixo. Ainda assim, se realmente fosse adotada tal prescrição, seria talvez muito melhor e mais saudável do que se entupir de medicações, não seria? No mínimo, pelo menos, a pele ficaria tinindo…