O que você, caro leitor, faria após terminar nove temporadas do mais influente seriado americano da década de 90? Como gastaria o dinheiro que amealhou com a venda dos direitos das incontáveis reprises de Seinfeld? Viveria uma vida de nababo em Hollywood dedicando-se exclusivamente ao ócio ou tentaria desenvolver outro seriado com temática ao mesmo tempo semelhante e diferente?

Dinheiro já não é mais problema. Um dos criadores e personagem principal do “programa sobre o nada”, Jerry Seinfeld, andou de bobeira por alguns anos. Casou-se, teve filhos, mas ainda assim produziu em 2002 o ótimo documentário Comedian. Em 2007, fez a voz do papel principal no desenho Bee Movie – A História de uma Abelha, um sucesso de bilheteria. Depois, andou produzindo alguns programas de televisão.

Desde 2012 vem fazendo a série Comedians in Cars Getting Coffee (Comediantes em Carros Tomando Café). É mais um programa sobre nada. “Cada episódio mostra Seinfeld apresentando um carro antigo, com o apresentador buscando um comediante convidado de carona para levá-lo a uma cafeteria ou restaurante pré-selecionado, onde tomam café”. Pronto.

O outro co-criador do programa, Larry David, com certeza não precisaria mais trabalhar na vida. A soma de dinheiro que os dois ganharam chega a soar indecente — ultrapassou, há muito, os bilhões de dólares. Para David, que já foi motorista de limusine, atendente de balcão e técnico em conserto de televisões, restaria então se aposentar e curtir a vida. De preferência em Hollywood acompanhado de uma linda mulher.

E é o que ele faz, pelo menos na ficção. Esta é a premissa principal de Segura a Onda. O seriado, produzido e transmitido pelo canal a cabo HBO desde 2000, concluiu a 12ª temporada em 2021 (houve alguns hiatos, obviamente). No programa, Larry interpreta a si mesmo: o co-criador de Seinfeld que leva a vida jogando golfe, frequentando festas, comendo em restaurantes, e batendo bico com os amigos — basicamente curtindo a vida de milionário pós-Seinfeld.

Soa chato, não é? Até seria se não fosse o fato de Larry David ser uma pessoa extremamente difícil e de personalidade cáustica. O homem só arruma confusão. Todo santo episódio deste seriado tem alguém que se aborrece ou se ofende com as situações que ele cria — ainda que inadvertidamente. O programa, como em Seinfeld, concentra-se nos detalhes do dia-a-dia que, mesmo sem aparente importância, sempre precipitam uma corrente de eventos com resultados constrangedores e hilários. Se algo pode dar errado, tudo em Segura a Onda conspira para isso. Uma verdadeira bíblia da Lei de Murphy — o proverbial copo meio vazio (veja artigo 86).

Larry David, tal qual o colega Jerry Seinfeld, começou a carreira fazendo stand up. Depois trabalhou escrevendo os quadros do legendário Saturday Night Live até conseguir vender Seinfeld para a rede de televisão NBC, onde atuava nos bastidores. Dizem as más linguas que um dos personagens, George Constanza (interpretado por Jason Alexander), foi inspirado na sua persona.

Segura A Onda é filmado sem script. O elenco tem noção do que vai ocorrer numa cena em particular, e daí em diante, tudo é improvisado. O resultado é tão autêntico que as situações parecem até reais.

Reza a lenda que as confusões que Larry David se mete foram, na sua maioria, inspiradas em eventos reais. Ainda assim, mesmo interpretando a si mesmo, David foi nominado algumas vezes como melhor ator para o Globo de Ouro.

E o que é, vocês perguntam, que este artigo tem a ver com Quiropraxia? Continuem lendo:

  • É recorrente em vários episódios a frustração de Larry David em lidar com uma crônica dor no pescoço. Num deles, ele é atendido por um acupunturista japonês. Deitado na maca, ele explica que já tentou de tudo (inclusive Quiropraxia). O profissional, então, fala para ele não se preocupar, porque é garantido que Larry ficará curado. Cético, o protagonista lança um desafio: se isto acontecer, pagará ao acupunturista a soma de US$ 5.000,00. Claro que isto dará pano pra manga. Por algum motivo, Larry recebe flores do japonês. Ele acha isto bizarro e sente-se desconfortável em continuar o tratamento. Ao cancelar a consulta com a recepcionista, inventa a desculpa que está melhor. O acupunturista interpreta, no seu inglês limitado, que Larry está curado. E exige os cinco mil dólares.

    Num dos episódios de Seinfeld, seu alterego, George Constanza, vai a um Quiropraxista, acha o atendimento rápido demais e vai embora sem pagar. Cabe a seu amigo, Jerry Seinfeld, a penosa e embaraçosa tarefa de quitar a dívida com o profissional.

  • Outro episódio de Segura a Onda narra a confusão que nosso herói se envolve quando, numa festa, confessa que não gosta de praticar sexo oral na esposa por causa da cervicalgia. Ela fica sabendo e se zanga. Ele, procurando se redimir, acaba providenciando o serviço, mas fica com o pescoço dolorido depois. E, ainda por cima, com um suspeito fio de cabelo preso em sua garganta, causando uma feia tosse.

  • Nosso protagonista não sofre somente de dores cervicais. Num episódio da quarta temporada, ele, habituado a fazer xixi sentado, cai dentro da privada quando sua esposa esquece o assento erguido. O resultado é uma dor lombar aguda que o obriga a andar de bengala o restante do tempo, enquanto atazana (naturalmente) a vida do próximo.

    Ironicamente, caros Quiros, uma paciente deste humilde escriba realmente deu um piripaque na coluna ao (pasme!) cair dentro de um cesto de lixo ao lado da privada (veja artigo 71). Seria a vida imitando a arte?

  • No episódio 06 da 11ª temporada, Larry vai num Quiropraxista por uma dor de coluna que é prontamente aliviada pelo tratamento. Mas ele nota que a recepção está sempre vazia. A recepcionista apressa-se em explicar que estão espaçando as consultas devido a pandemia.

    Este que vos escreve faz o mesmo agendamento na sua clínica, então até aí tudo bem.

    O Quiropraxista é um sujeito grandão, rotundo — interpretado pelo comediante Josh Gad (a voz de do bonequinho de neve Olaf em Frozen). No seriado, ele faz tudo certo. Até a maca hi-lo está lá! Mas o protagonista tem dúvidas se deve continuar o tratamento. E a razão para tanto é porque, na hora que o Quiropraxista se abaixa para pegar alguma coisa, Larry é agraciado (mais de uma vez) com um vislumbre da cueca do profissional.

    Mas não é uma cueca qualquer. É uma cueca que parece ter passado pela Primeira e Segunda Guerra Mundial, além das guerras da Coreia, do Vietnã, do Golfo, do Afeganistão e da Ucrânia — todas juntas e de uma vez só. A cueca é uma belezura: tem mais furos do que queijo suíço e ainda perdeu a cor original (que se espera que tenha sido a cor amarela).

    Mais tarde no episódio, ele toma coragem e fala ao Quiropraxista que a razão para ter tão poucos pacientes talvez seja o estado da sua cueca. Surpreendentemente, o profissional não o põe pra correr do consultório (como era de se esperar). O Quiro reflite, reconhece o problema, e compra um enxoval novo de roupas de baixo melhorando então seu fluxo de pacientes.

    E que isso sirva de lição para nós. Que o parco movimento de uma clínica, às vezes, provém de algo mais profundo…