O irlandês Bono Vox, vocalista da banda de rock U2, músico, ativista, filantropo e empresário teve sua crise nos idos de 2010. Houve uma forte compressão no nervo ciático, o que causou, de acordo com o neurocirurgião Joerg-Christian Tonn, “uma paralisia parcial na parte inferior da perna”. Foi necessário, portanto, fazer cirurgia de emergência: uma microdiscectomia endoscópica, em que um tubo passa por um corte de 2 centímetros sem necessidade de dissecar a musculatura. Remove-se umas lasquinhas de lâmina e voilà — o canal espinhal é visualizado através do tubo por magnificação de alta potência e o fragmento discal, removido. Em 6 semanas, o paciente pode resumir praticamente toda a sua atividade. Deve ter dado certo porque durante a retomada do “360° Tour”, Bono correu, trotou, dançou e nem parecia um homem de então 50 anos recém-saído da cirurgia (menos de dez semanas). É, mas para ter tido este tipo de progresso, o vocalista da U2 afirma que fez quatro horas de fisioterapia por dia. Ou seja, realizou um excelente e árduo trabalho de reabilitação.
Segundo o empresário da banda, Paul McGuinness, o período que Bono ficou parado acarretou em 15 milhões de dólares de prejuízos para a banda, “mas metade da quantia foi coberta por seguros”. De acordo com McGuinness, foi enormemente complicado reagendar os shows nos E.U.A., “mas pouquíssima gente pediu reembolso, e a maioria dos shows estão (com ingressos) esgotados”, afirma. A etapa norte-americana acabou ficando para 2011. De qualquer maneira, estima-se que o faturamento final do “360° Tour”, que começou em 2009 em Barcelona (batizado assim por causa de um enorme palco circular arrodeado pela platéia), tenha ficado em torno de 650 a 700 milhões de dólares — em valores da época.
Durante o show do dia 06 de agosto, em Turim, na Itália, Bono agradeceu seu público pelas cartas e e-mails torcendo por sua recuperação. “Esta banda é como uma família. É um negócio familiar, o U2. Eu sou o filho pródigo, eu gostaria de agradecer meus irmãos por sua paciência”, disse.
A decisão de submeter o cantor a uma cirurgia partiu do renomado ortopedista Hans-Wilhelm Müller-Wohlfahrt, tomada com base nos resultados de uma ressonância magnética. “Dei-me conta de que não havia outra opção a não ser uma operação cirúrgica”, afirmou. Médico oficial do time alemão Bayern de Munique e autoridade mundial em medicina esportiva, é também conhecido por seus métodos pouco ortodoxos como usar uma substância extraída da crista de galos para “lubrificar o joelho e aliviar a dor”, ou injetar sangue de bode ou bezerro para tratar lesões musculares.
“A cirurgia era a única maneira de ele se recuperar completamente e evitar paralisia no futuro”, salientou o Dr. Tonn. Os dois profissionais que trataram de Bono são, indiscutivelmente, autoridades competentes em suas respectivas áreas. Ainda assim, sobressai a impressão que a decisão cirúrgica foi tomada um tanto rápida demais e com uma pitada de alarmismo. Será que um tratamento conservador não teria surtido efeito semelhante? A pressão para voltar à turnê não teria falado mais alto?
Sim, porque, vale salientar que, mesmo com o excelente trabalho dos neurocirurgiões que operaram Bono, sua incrível recuperação deve-se ao fato de ter realizado reabilitação intensiva. Alongamento, fisioterapia e exercícios específicos e aplicados para o problema em questão são tão importantes quanto a cirurgia. Isso não pode ser enfatizado o suficiente — e é justamente o que é frequentemente negligenciado durante a recuperação do paciente. Reabilitação deve ser priorizada porque ajuda a prevenir reincidências. Afinal de contas, nenhuma cirurgia, invasiva ou não, reforçará a estrutura muscular da coluna. A musculatura paravertebral e abdominal representam a síntese da sustentação da coluna vertebral — e nestes tempos de sedentarismo devem ser devidamente trabalhadas.
Paira a dúvida se a cirurgia endoscópica percutânea não teria sido mais indicada, já que nela a lâmina fica relativamente preservada. Esta consiste na utilização de videolaparoscopia para atingir a área afetada. Faz-se uma incisão de cerca de 0,7 centímetros na região lombar, insere-se uma cânula até a região e injeta-se uma solução de soro e antibióticos. A anestesia é local, a taxa de infecção pós-operatória não chega a 1% e o paciente pode receber alta no mesmo dia. Considerado o maior especialista neste tipo de procedimento, o neurocirurgião Gun Choi, do Wooridul Spine Hospital, na Coréia do Sul, afirma que “com essa técnica podemos retirar o tecido da parte posterior do disco inflamado e aliviar a dor do paciente”, e até prevê que, no futuro, pode ser até utilizado em outras situações como “a reconstrução da estrutura entre as vértebras com a utilização de células-tronco”. Mas na época, o procedimento era relativamente novo, até então inédito no Brasil, e havendo sido apresentado durante o 6º Simpósio Internacional de Cirurgia Minimamente Invasiva da Coluna em São Paulo em 2009.
Desconhece-se também se houve alguma reincidência com Bono.