A regulamentação da Quiropraxia como profissão ainda tramita no Congresso Nacional. É um processo até um certo ponto natural: a atividade no Brasil é relativamente nova. A luta começou no início da década de 90. Dez anos antes, só existia um profissional formado atuando no país. Em 1996, já contávamos com oito Quiropraxistas. Duas faculdades foram estabelecidas no final dos anos 90, uma em São Paulo e outra no Rio Grande do Sul. E, por isso, na época que este artigo foi escrito originalmente, havia cerca de 500 profissionais formados no Brasil. Hoje já devemos ter ultrapassado a marca dos 1400. E com mais 3 faculdades em atividade e mais uma por abrir, este número vai ficar maior ainda.

Ainda assim, se compararmos com os milhares de médicos e fisioterapeutas em atividade, este número é quase microscópico. E, portanto, praticamente sem voz política.

No entanto, e por incrível que pareça, até pouco tempo atrás existia também outra profissão da área da saúde no Brasil que ainda não tinha uma regulamentação: a medicina.

Para corrigir tal discrepância, “após 12 anos de tramitação e mobilização das entidades médicas”, em 2013 foi enfim promulgada a Lei nº 12.842/2013, que tecnicamente “regulamenta o exercício da profissão médica no Brasil”.

Hoje mais conhecida como Lei do Ato Médico, se seu intuito inicial foi trazer “inovações importantes às atividades comerciais específicas dos médicos” e buscar “garantir a qualidade do atendimento e proteger a sociedade de práticas não regulamentadas que possam colocar a saúde de pacientes em risco”, na prática sua execução ficou ligeiramente controversa. “(…) em princípio, só o médico pode diagnosticar doenças e determinar tratamentos, decidir sobre cirurgias e determinar sobre procedimentos invasivos”. Propositalmente ou não, o texto é meio vago. Se somente o médico pode “determinar tratamentos”, isso implica perda de autonomia por parte de outras profissões como fisioterapia e psicologia. E o conceito de “procedimento invasivo” teria que ser explicado com mais detalhes. Já imaginou um tatuador tendo que ter autorização médica para realizar seu trabalho? Uma emenda aprovada ao projeto em tese protegeria os psicólogos. E a lei, também em tese, “resguardaria as competências específicas das profissões” da área da saúde já regulamentadas e de outras profissões “correlatas” que possam vir a ser. Quiropraxia se encaixaria nesta última afirmação?

O périplo no Congresso foi grande (a gente bem sabe o que é isso…): “foi aprovado no Senado em 2006 e enviado à Câmara, onde foi modificado pelos deputados. Com as mudanças, voltou (para o Senado) em 2009 (…)”.  Em fevereiro de 2012, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal aprovou, “em votação simbólica, o projeto do Ato Médico (SCD 268/2002), que estabelece atividades privativas dos médicos. (…) A matéria será ainda analisada (por outras comissões) antes de seguir para Plenário”.

Na época, a profissão médica tinha certa urgência para aprovar tal projeto de lei. Isso porque um outro, proposto pela senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), pedia “reconhecimento de diplomas de cursos de graduação em medicina expedidos por instituições estrangeiras de ensino superior (…)” e já estava também tramitando no Congresso.

Foi um Deus nos acuda. Mário Vianna, presidente do Sindicato dos Médicos do Amazonas (Simeam), disparou: “Isso é um absurdo, é interesse comunista, pois nossos alunos se esforçam, estudam para passar no vestibular e se dedicam durante anos para alunos estrangeiros chegarem aqui e exercerem a profissão sem nenhuma prova de validação? Isso não está certo!”. Para o doutor Jefferson Jezini, então presidente do Conselho Regional de Medicina (CRM-AM), o projeto era de cunho político. “Existem filhos de deputados e senadores que fazem faculdade em outros países e estão querendo facilitar o exercício da profissão no Brasil”, denunciou. “Quando medicamentos potentes procedimentos tecnológicos invasivos estão nas mãos de quem não está qualificado, isso pode produzir sequelas graves e até morte”, alertou o Conselheiro do Cremeb Jecé Brandão, também membro da Comissão Nacional de Ensino Médico.

Hoje em dia, “(…) para que um médico formado fora do Brasil seja habilitado a exercer a medicina no País, é necessário que ele passe por um processo de capacitação e um exame para avaliar sua competência de acordo com a realidade e parâmetros brasileiros: o Revalida” (Revista Luta Médica). O problema é que o Revalida é caro e extremamente rigoroso — a tal ponto que foge até do razoável (ver Artigo 233).

O doutor Mário Vianna “ressaltou (…) que na última prova realizada no ano de 2011, de 600 formandos em Medicina estrangeiros que passaram pelo exame, apenas três foram aprovados”. É. Com estas estatísticas, talvez seja mais fácil passar mesmo no ENEM. O resultado desta história todos sabem e já foi inclusive discutido anteriormente…

Mas voltando a questão do Ato Médico, se formos fazer um paralelo com a nossa própria luta para regulamentar a Quiropraxia, parecemos meio que um monte de crianças se metendo em briga de gente grande, não é?  Temos pouca força política. Temos, apesar do crescimento, ainda poucos profissionais no Brasil. Temos uma certa deputada que vestiu a camisa de um certo conselho e que vive emperrando a pauta. Temos, por outro lado, perseverança e convicção do nosso trabalho, nosso valor e nossa singularidade como profissão.

Haveremos de prevalecer.