Não se fala muito nela hoje em dia, mas a Escola da Coluna (Back School em inglês) já foi bastante difundida nos Estados Unidos — desde a sua criação em 1969 até, pelo menos, a década de 90. Criada pela fisioterapeuta sueca Mariane Zachrisson-Forssell, depois difundida em larga escala pela Cruz Vermelha Americana, o curso é dado para leigos e parte do princípio de que a vasta maioria dos problemas de coluna se origina de vícios de postura adquiridos durante a vida, e não de traumas ou acidentes, como geralmente se pensa.

A intenção é bombardear as pessoas com conhecimento. Entender e evitar os fatores de risco da coluna encurta o tempo de tratamento, aumenta o percentual de melhora do paciente, e o retorna sadio ao seu trabalho. Onera-se menos o INSS, o empregador não perde produtividade, e a auto-estima do trabalhador é restaurada. Todos ganham. “Pacientes submetidos à Escola da Coluna faltam menos dias de trabalho do que pacientes que recebem tratamento alopático ou fisioterapia tradicional” (ver Artigo 151).

Aqui no Brasil, o projeto já caminhou com mais destreza. Começou como “Escola de Postura” em 1972 no Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo pelo reumatologista José Knoplich (sim, aquele que escreveu o magnífico livro Viva Bem com a Coluna Que Você Tem (ver resenha no artigo 129). Existe desde 1990 no Departamento de Fisioterapia da Universidade Federal da Paraíba um programa de extensão (também chamado de Escola de Posturas) que é guiado para as comunidades. O enfoque é dado à exercícios, auto-massagem, e técnicas de respiração. Em 1993, a Universidade Federal de São Paulo (Escola Paulista de Medicina) criou sua própria “Escola de Coluna” para pacientes com lombalgia crônica. E em 1994, a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) iniciou a “Escola das Costas” para pacientes com dores lombares, torácicas e/ou cervicais.

Os resultados são bastante promissores. “(…) a maioria dos participantes que passaram pelo programa de Escola da Coluna (…) conseguiram a longo prazo manter os hábitos posturais a partir das orientações aprendidas no programa e obtiveram melhora da dor, da postura corporal e da qualidade de vida além da melhora significativa da capacidade funcional”, conclui estudos. Viram isso? Resultados a longo prazo.

Na década de 90, chegamos a ministrar um curso de Escola da Coluna em Brasília — com a ideia de eventualmente estabelecer encontros semanais regulares para pacientes que estivessem interessados. Imaginem como seria legal implantar um programa desses numa clínica de Quiropraxia?

O Back School começa com uma investigação sobre ergonomia no trabalho. Discutem-se tópicos como LER/DORT, posição do computador, altura de cadeira e mesa, e intervalos para evitar sobrecarga (recomenda-se 15 minutos a cada 02 horas). O que difere é o protocolo adotado por cada instituição e o número de aulas: 5 na FMUSP; 4 na UNIFESP; e 16 (!) na UFPB.

Fatores que podem colocar em risco a coluna vertebral são abordados, como dormir, sentar, ficar em pé, caminhar, correr, fumar, tossir e espirrar, passando por hobbies, atividades diárias, fatores nutricionais e psicológicos. São dadas “orientações posturais básicas; técnicas de relaxamento e respiração; exercícios para coluna lombar, pescoço, braço e cintura pélvica; vivência com massagem dos pés, nuca e coluna; treino de marcha e uma reavaliação final” (a UFPB criou um manual sobre isso). Até sexo e necessidades fisiológicas são mencionados. O curso não deixa pedra sobre pedra.

Todos estes fatores são enfocados sob o ângulo da chamada pressão intradiscal: tudo que podemos evitar para não aumentar de maneira nociva a pressão de dentro do disco (como o nome sugere) — e fugir dela como o diabo foge da cruz.

  • Ao dormir, discute-se o tipo de colchão adequado (ver artigo 59). Ortopédico? Com espuma ou com tábua? E quanto aos colchões magnéticos? Realmente funcionam? Um colchão de 4,000 reais é realmente melhor do que um de 1,000?

    A posição de dormir é igualmente importante. De lado, é necessário um travesseiro que proporcione um bom suporte cervical e outro entre as pernas ligeiramente flexionadas para relaxar um músculo chamado psoas. Este músculo, quando tenso, aumenta a pressão axial na coluna, e conseqüentemente a pressão intradiscal. Isto acontece ao dormirmos de bruços.

  • Sentar exige uma cadeira com bom suporte lombar. Isso vale também para o assento do automóvel ao dirigir (ver artigo 128). A altura da cadeira deve ficar 02 centímetros abaixo do espaço poplietal (de trás do joelho). Existem algumas maneiras de se levantar apropriadamente, e todas são abordadas.

  • Ficar em pé por muito tempo causa desconforto nas melhores colunas. Interrupções para caminhar ajudam, bem como apoiar o pé num banquinho ou degrau (flexão dos quadris reduz a tensão do psoas). E quanto aos sapatos de salto alto?

  • Caminhar produz variações na pressão intradiscal e acelera a troca de fluidos no disco por meio de difusão. Por isso é altamente recomendável (ver artigo 35). Já correr, seria melhor deixar para aqueles que não sofram de coluna, em particular hérnia de disco ou lombalgia aguda. Correr é uma atividade de impacto (ver artigo 54). É necessário um bom tênis, pelo menos. Até a marcha do paciente é investigada, pois pronação excessiva dos pés, por exemplo, aumenta o esforço desprendido pela coluna ao caminhar, e pode gerar predisposição à lombalgia — principalmente na 5ª vértebra lombar.

  • Já é público e notório os efeitos nocivos do tabagismo. Mas fumar também faz mal a coluna. A nicotina diminui a absorção de vitamina C e acaba comprometendo a formação do colágeno (ver artigo 36). “Fumantes são duas vezes mais propensos a desenvolver lombalgia do que não-fumantes” (J.W. Frymoyer, et. al., Journal of Boné and Joint Surgery). Fumar altera o metabolismo do disco, e a tosse crônica associada à este ato afeta a coluna — como mostrada no parágrafo abaixo.

  • Tossir e espirrar aumentam sensivelmente a pressão intra-abdominal, e conseqüentemente a pressão intradiscal. Vários casos de hérnia de disco começam a partir de um simples espirro. Já foram até documentadas microfraturas vertebrais em pessoas que sofrem de enfisema pulmonar, rinite alérgica e bronquite crônica por tossirem excessivamente.

  • O ideal seria possuir um hobby que ajudasse a coluna vertebral. Natação, por exemplo (exceto talvez pelo nado de borboleta). E falando nisso, colecionar borboletas não afetaria a coluna em princípio, a não ser correndo atrás delas. Fazer trilha com motocicleta não ajuda muito. E pior ainda fazer o papel do atleta de fim-de-semana.

  • Evitar sentir dor na coluna requer constante vigilância, especialmente nas atividade diárias (ver artigo 8). A rotina muitas vezes nos pega de surpresa. A maneira de levantar da cama, a posição de escovar os dentes, de se ensaboar e de se enxugar com a toalha, de entrar no carro para trabalhar, de sentar no sofá para assistir televisão, de colocar os filhos para dormir, ou o bebê no berço — tudo isso tem que ser revisto. E melhorado.

  • Obesidade, apesar de não ser o único causador de problemas de coluna, é não obstante um dos fatores de risco (ver artigo 126). Evitar ingerir produtos refinados (como açúcar e farinha de trigo), consumir mais vitamina C e B (ver artigo 95), bem como evitar cafeína, e álcool (além do fumo), têm benefícios comprovados.

  • Um estudo realizado na Dinamarca em 1987 constatou que pessoas que sofrem  de fadiga, cefaléia, nervosismo, taquicardia e sudorese excessiva (sintomas de estresse) têm duas vezes mais chances de desenvolver uma hérnia de disco, principalmente as do sexo feminino. A questão é se ansiedade, depressão e estresse causam lombalgia, ou vice-versa. O proverbial ovo e a galinha. (Veja artigo 138)

  • Abstinência sexual não é obrigatória para os sofredores de coluna, exceto talvez para casos de dores agudas. O segredo está nas posições (ver artigo 76).

  • Prisão de ventre, por outro lado, pode complicar e muito um processo de lombalgia. Há fatores hormonais que afetam o limiar da dor (ver artigo 61). E ler por muito tempo no “trono” definitivamente não ajuda muito.

O curso conclui com algumas dicas de exercícios. E enfatiza: prevenir é o melhor remédio. E também brinda seus participantes com um pouco de conhecimento, que nunca é demais.

Entender os fatores de risco é essencial para poder evitá-los. O custo social dos problemas de coluna é alto, e a Escola da Coluna pode ajudar a minimizar o ônus imposto à sociedade. Vale a pena difundi-la melhor.