Desmond Morris (ver Artigo 26) fez uma zoada danada quando publicou em 1967 o livro The Naked Ape: A Zoologist’s Study of the Human Animal. Conhecido no Brasil como O Macaco Nu, trata-se de um estudo sociobiológico sobre comportamento humano sob um ponto de vista evolutivo.

38 anos depois ele concluiu A Mulher Nua: Um Estudo do Corpo Feminino (Editora Globo, São Paulo, 2005). Nesta obra, cada capítulo é dedicado a uma parte do corpo feminino e a importância “que cada parte do corpo teve durante a história da humanidade, e as modificações e decorações utilizadas por diferentes culturas” — e como a mulher em particular sofreu modificações evolutivas mais pontuais.

Alguns poucos anos mais tarde, Morris escreveu O Homem Nu: Um Estudo do Corpo Masculino aparentemente com menos impacto.

Mas o que isto tudo tem a ver com este artigo? Pois bem, há uma discussão interessante no livro A Mulher Nua justamente sobre a coluna vertebral! Mesmo sendo observações óbvias para quem lida com isso diariamente, ainda assim é interessante revisitar nosso bê-a-bá e acompanhar o ponto de vista de um famoso zoólogo e etólogo. Vamos lá, então.

A coluna vertebral “é um conjunto brilhantemente entrosado de músculos e ossos com a dupla função de sustentar e proteger a medula espinhal” — esta, uma espécie de “rabicho” proveniente do cérebro que conta com aproximadamente 46 centímetros de comprimento e pouco mais de 1 cm de diâmetro. Com estas medidas, a medula precisa muito de proteção — proporcionadas pelas 33 vértebras alinhadas uma em cima da outra.

O canal medular é um buraco que existe em cada uma dessas vértebras. Dentro deste canal, três membranas cobrem a medula, que, ainda por cima, é embebida no líquido raquidiano. O objetivo para tanta proteção é absorver choque. Resumindo: há proteção externa (as 33 vértebras que compõem a coluna) e interna (as membranas e o tal líquido).

Há cinco tipos de vértebras:

  • 7 no pescoço (cervicais);

    As sete vértebras cervicais gozam de incrível mobilidade. Permitem uma enorme variedade e amplitude de movimentos. Com eles, podemos proteger o rosto e a cabeça, além de permitir uma ampla percepção do mundo que nos cerca. Esta região é muito susceptível a atividades braçais, burocráticas, vícios posturais, tensão e idade. Rigidez e dor nesta área são chamadas de cervicalgias, e têm caráter transitório. Responde por aproximadamente 30% dos casos de coluna vistos em nossa clínica.

  • 12 no meio das costas (torácicas ou dorsais);

    As doze vértebras dorsais têm a função de ancorar as costelas e estabilizar a caixa torácica, que protege órgãos vitais, como o coração, os pulmões e o fígado. Por isso, a mobilidade é muito mais limitada do que nas cervicais. Dores nesta região não são tão comuns e podem estar relacionadas a outro problema além da coluna. Necessita-se atenção para identificá-las e separar a dorsalgia pura e simples de outro mal maior.

  • 5 logo acima do quadril (lombares);

    As cinco vértebras lombares assumiram um papel fundamental ao passarmos a andar ereto: nelas, há nosso centro de gravidade, e grande sustentação de peso. Com o tempo, tornaram-se mais pesadas e espessas. Ainda assim, as dores mais severas da coluna vertebral se instalam aí. A lombalgia é a segunda dor mais comum nos seres humanos. Só perde para a cefaléia (dor de cabeça). Não é considerada doença e sim um sintoma que pode ter mais de 50 causas diferentes. Pode afetar, em algum momento, 80% da população adulta com menos de 45 anos — 70% dos pacientes na nossa clínica.

  • 1 sacro (formado pela eventual fusão de cinco vértebras);

    O osso sacro, como dito acima, é resultado da união das cinco vértebras sacrais. “Em círculos ocultistas, o sacro é considerado o osso mais importante do corpo, ao qual é atribuído um papel especial nos rituais divinatórios”. Problemas nesta região, onde se originam fibras nervosas do sistema parassimpático, podem afetar funções viscerais.

  • e 1 cóccix (quatro vértebras também eventualmente fundidas).

    O cóccix é um remanescente da cauda dos primatas. Às vezes atrapalha mais do que ajuda, principalmente quando caímos de bunda. A palavra vem do grego coccyx (kóκκυξ) e significa “cuco”. Aparentemente, os primeiros anatomistas acharam que o bico torto deste pássaro se parecia com o osso em questão. Coccidinia é o termo usado para denotar dor no cóccix.

Nada menos do que seis camadas de músculos cobrem os ossos da coluna. Ela, no entanto, é mais suscetível a três grupos principais: o trapézio, os músculos dorsais e os glúteos. Ao assumirmos a posição ereta, os músculos das costas passaram a trabalhar constantemente. Eles sustentam a coluna e aliviam a carga dos discos intervertebrais e das articulações zigapofiseais. Podem ser enfraquecidos por falta de exercício em decorrência de uma vida urbana sedentária. Postura errada, lesões diversas ou esforço repetitivo afetam também a musculatura da coluna.

Com o perdão das possíveis divergências dos puristas, ousamos lembrar novamente que esta descrição apenas segue a opinião de um zoólogo e etólogo — que não é Quiropraxista, ressalte-se.

Não obstante, nossas costas trabalham muito. E, apesar da mídia, ainda são relativamente pouco compreendidas fora do nosso metiê. Só ao sentirmos dores é que nos damos conta de que fazem parte de nossa anatomia. Assintomática, a coluna não passa de algo que está longe da vista e da mente. Mas deveríamos tratá-la com carinho. Sempre.